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Artigo em O Popular: “Brasil, sublime e caótico”

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(A Música Segundo Tom Jobim / Nelson Pereira dos Santos e Dora Jobim, 2012)

(A Música Segundo Tom Jobim / Nelson Pereira dos Santos e Dora Jobim, 2012)

Lisandro Nogueira* //

Acabei de rever A música segundo Tom Jobim, de Nelson Pereira dos Santos e Dora Jobim. Depois de ouvir vários cantores interpretando a bossa (na verdade, músicas que interpretam o Brasil), fiquei perplexo, triste e me perguntando: será que o Brasil vai ser só isso (crises, cotidiano inseguro, enormes diferenças, obtusidade intelectual e politica) a vida inteira? E a promessa de ser um grande país é mesmo uma tremenda ilusão? Nós nos autoenganamos?

O mais complexo, por incrivel que pareça, nós já realizamos: a música brasileira, a bossa nova, Tom, Vinicius de Moraes e outras expressõe artísticas.

O que é difícil, mas não tão complexo, é a politica e a economia. Todavia, somos adeptos da procastinação e dos cuidados exagerados ao colocar o dedo nas velhas feridas – país extremamente desigual, privilégios para certas instituições, etc. É fundamental mudar os paradigmas e mudar de vez o estatuto de “país oscilante”, além de ser um dos mais desiguais do mundo – que possui altíssimos índices de violência e educação pedestre.

Alguns países ficaram fortes porque fizeram pactos internos vigorosos, mesmo com altas divergências entre os grupos. Outros, tiveram confrontos internos fortes. De um jeito ou de outro, superaram vários problemas e são paradigmas incontestáveis (EUA, França, Inglaterra). Aqui, nenhuma coisa e nem outra. Por isso, a preocupação com o futuro. Vamos dar dois passos para continuar no mesmo lugar?

Temo que talvez sejamos o país que vai passar a vida lamentando não ter “dado o salto”. O Brasil é aquele eterno candidato a alguma coisa grande que nunca se concretiza? A construção é constantemente solapada pela ruína endemica e pelo sabotagem vigorosa de grupos? Mas como consegue fazer algo tão sofisticado como Tom Jobim? Que paradoxo é esse: é tão inteligente aqui e tão limitado acolá? Não vai e nem vem. Sabe fazer arte de altíssimo nível e não sabe quebrar os ovos para fazer o omelete tão desejado?

Entre a arte poderosa e reconhecida de Tom Jobim e a Política pobre que não consegue erguer e sustentar o potencial gigante, estamos sempre adiando encarar nossos problemas atávicos, desde o final do século 19. E agora eles se tornaram inadiáveis, complexos e, alguns, quase que dramaticamente insolúveis.

Qual país? Pergunta velha e amarrotada, mas sempre na ordem do dia, ela pode vicejar agora, de outro modo, impondo a urgência e encaminhando saídas sem as soluções “por cima”. Na época das redes digitais é quase impossível acordos para “ficar tudo do jeito como sempre esteve”. E mais: existe um medo crescente na população: de perder as recentes conquistas na renda, o acesso aos bens materiais e a almejada ascensão social. O nervosismo e a impaciência são crescentes e a crise econômica só vai colocar gás na chapa que já está fervendo.

Com pactos ou embates duros, visando sempre a democracia, o Brasil não pode mais adiar o confronto com as velhissímas questões e dilemas. Ou vai agora ou vai adiar, mais uma vez, a promessa do salto qualitativo. O mundo veloz não vai esperar o Brasil e sua procastinação histórica.


*Lisandro Nogueira é doutor pela PUC-SP, mestre pela USP, professor na FIC-UFG. Artigo originalmente publicado no jornal O Popular em 17 de março de 2015.



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